Numa semana onde Hollywood se engalanou para celebrar a "sétima arte", com a entrega dos Óscares e a ilha Terceira aplaudiu de pé a sua maior manifestação cultural - o Carnaval, parece não haver melhor momento para se falar sobre atores e atrizes, trajes e figurantes, enredos e bandas sonoras... Afigura-se a altura perfeita para os Terceirenses e para os Praienses, em particular, deixarem de ser meros figurantes e assumirem o papel de atores principais, na defesa dos seus interesses. Proponho como cenário, como pano de fundo, a Base das Lajes e seu enquadramento no novo panorama geopolítico mundial.
Como ponto de partida, importa ter presente, que a Base das Lajes tem sido, ao longo de décadas, um ativo estratégico fundamental para Portugal, os Estados Unidos da América e a NATO. Situada num ponto nevrálgico do Atlântico, esta infraestrutura tem desempenhado um papel determinante na segurança internacional, mas também na economia da ilha Terceira e, em particular, do concelho da Praia da Vitória. No entanto, os Praienses e os Terceirenses não podem continuar a ser atores secundários, ou em bom rigor, meros figurantes neste processo, acatando e aceitando, impávidos e serenos, tudo o que é decidido nas cúpulas do poder. É altura de termos voz ativa, de exigirmos um efetivo retorno, económico e social, pela presença desta infraestrutura na nossa ilha.
A existência da Base das Lajes, sendo certo que transporta benefícios, tem concomitantemente custos e impactos diretos na vida da população local, nomeadamente na utilização do território e nos condicionamentos económicos e sociais que dela advêm. Para além disso, há um fator que tem sido frequentemente desvalorizado - a pegada ecológica resultante das atividades militares, que afeta sobretudo os Praienses. A contaminação dos solos e lençóis freáticos, associada a práticas ambientais negligentes ao longo de anos, continua a ser uma preocupação que exige uma resposta proporcional e contundente. É pois, da mais elementar justiça que a Praia da Vitória tenha uma discriminação positiva por parte do Estado português e beneficie diretamente dos dividendos do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os EUA, o vulgarmente designado Acordo da Base das Lajes.
O tempo da passividade tem de acabar. Os praienses e os terceirenses têm de exigir aquilo que lhes é devido, e não apenas ficar à espera de eventuais migalhas. O Acordo da Base das Lajes gera receitas para o Estado português, apesar de atualmente não se perceber muito bem quais, mas é a ilha Terceira, e em particular Praia da Vitória, que suporta os encargos diretos da presença militar americana. A lógica e os mais elementares princípios de justiça, impõe que o concelho seja justamente compensado, através de um mecanismo claro e transparente de canalização de fundos e apoios multidisciplinares.
Acresce que a Base das Lajes tem sofrido um downsizing progressivo, perdendo continuamente importância estratégica no contexto da defesa americana. A redução de efetivos e a falta de um plano claro para o futuro deixam a região numa situação de incerteza.
No atual cenário geopolítico mundial, com uma nova administração nos EUA, cujas posições relativamente à NATO e às alianças internacionais são incertas, o futuro da Base das Lajes tem urgentemente de ser clarificado. As ameaças de retirada dos EUA da NATO, ou uma eventual redução do seu compromisso militar no Atlântico Norte, impõem uma reflexão séria. O que acontecerá à Base das Lajes?
Mais do que nunca, é necessário que os responsáveis políticos e a sociedade civil se mobilizem para garantir que a Base das Lajes continue a ser um ativo valorizado e que a sua presença se traduza em benefícios concretos para a população local. É urgente lutar por uma revisão do Acordo da Base das Lajes que inclua, de forma inequívoca, dividendos diretos para a ilha Terceira e, em particular, para a Praia da Vitória.
Por outro lado, Portugal e os Açores não podem, de forma alguma, "passar um cheque em branco" a Donald Trump, conhecendo a sua personalidade e os seus desvarios a nível da política internacional. É fundamental que qualquer negociação futura seja conduzida com prudência, garantindo os interesses da região e do país, sem cair em concessões irrefletidas.
A Terceira e os Praienses não podem ser apenas espectadores neste novo contexto mundial. É tempo de reivindicar, de exigir e de lutar pelo que é justo. O futuro da nossa terra é muito mais do que isso, mas também depende disso.
Que na próxima entrega dos Óscares, a Terceira e a Praia da Vitória possam ser candidatos ao galardão de ator principal e que no próximo Carnaval a Base das Lajes não seja assunto, pelos piores motivos, para as nossas danças e bailinhos!